Convergência dos Padrões Internacionais de Contabilidade

O material abaixo foi extraído do Livro USGAAP: Principais Diferenças com as Normas Internacionais e Brasileiras de Contabilidade (Portuguese Edition), disponível exclusivamente na Amazon:

 

Padrões Internacionais de contabilidade.

 

Padrões comparáveis de contabilidade permitem uma maior integração entre empresas, investidores e os demais usuários das informações contábeis. O mundo há tempos reduziu suas fronteiras econômicas o que trouxe a importância de um padrão de contabilidade que se destaque e que seja uniforme entre os países.

 

De maneira similar, se a língua inglesa é a linguagem falada negócios, o padrão contábil internacional é a língua econômica dos negócios.  Não basta que os indivíduos falem a mesma língua nas relações econômicas, é importante que os números gerados entre esses indivíduos sejam feitos seguindo regras similares e comparáveis.

 

Neste cenário o IASB – International Accounting Standard Board se destacou com a publicação das IFRS – International Financial Reporting Standard, padrão este utilizado ou permitido em boa parte do mundo devido a sua alta qualidade e aderência de diversos países. Isto fica evidente quando observamos o mapa abaixo onde os itens pintados em azul requerem a aplicação das IFRS para empresas listadas ou não.

 

 

 

A origem das IFRS se deu na Europa, continente este apesar de muito rico e representativo a nível global, possuem países com dimensões pequenas o que naturalmente provocou grande intercâmbio econômico entre seus países. Isso, somado as diferentes línguas dos pequenos, mas poderosos países que compõem o continente europeu, criou um terreno fértil para consolidação de um padrão internacional.

 

Certamente o grande impulso das IFRS se deu pela publicação pela Comissão Europeia em 2003 requerendo que as demonstrações financeiras consolidadas publicadas pelas empresas listadas europeias seguissem o padrão das IFRS a partir de 2005.

 

Assim como outros países o Brasil acompanhou a convergência com as normas IFRS com exigências trazidas pelo Banco Central do Brasil e pela CVM - Comissão de Valores Mobiliários, valendo destaque à publicação da Lei 11.638/07, que culminou com a oficialização do CPC – Comitê de Pronunciamentos Contábeis, órgão este que se dedica a desenvolvimento de padrões contábeis em alta medida convergidos com as IFRS.

 

Contudo, apesar das IFRS terem ganhado força, continuava e continua a existir países que não requerem a publicação das demonstrações contábeis das empresas seguindo as IFRS e neste cenário existe um destaque muito grande para os EUA, que representavam em 2017 quase 25% do Produto Interno Bruto (PIB) global.

 

 

 

Fonte: Howmuch.net

 

Nesse cenário, mesmo que as IFRS sejam de alta qualidade e estejam espalhadas pelo globo não podemos considerar o fato dos EUA não exigirem ou permitirem que suas empresas publiquem as suas demonstrações em IFRS e, por ser a maior economia do mundo, os EUA influenciam direta e indiretamente os padrões contábeis ao redor do mundo, seja por ser uma referência ou pela presença das suas empresas com sucursais ao redor do mudo.

 

Podemos exemplifica o caso do Japão que permite que as empresas listadas nas bolsas de valores publiquem as demonstrações contábeis consolidadas em IFRS ou seguindo os padrões dos EUA, além da opção pelo uso de padrões locais.

 

Outro exemplo da influência dos EUA é o caso do Canada, onde apesar das IFRS serem requeridas para a maioria das empresas listadas e instituições financeiras, existe a opção das companhias que também operam nos Estados Unidos ou que também tenham ações listadas na bolsa de valores dos EUA possam a aplicar os padrões contábeis estadunidenses.

 

Por este cenário as normas dos EUA, emitidas pelo órgão estadunidense, FASB - Federal Accounting Standards Board, são de grande relevância no cenário internacional.

 

O FASB foi Criado em 1973 e é a organização responsável no setor privado por estabelecer os padrões de contabilidade que regem a preparação das Demonstrações Contábeis (Financeiras) neste país.

 

Este órgão, similar ao CPC brasileiro e ao IASB internacional, é oficialmente reconhecido pela Securities and Exchange Commission (SEC, a CVM americana) e pelo American Institute of Certified Public Accountants (AICPA).

 

De forma comparativa o AICPA seria equivalente ao Conselho Federal de Contabilidade brasileiro, sendo o órgão que regula a profissão nos EUA.

 

Diferentemente dos EUA ou do Brasil, no cenário das IFRS não existe um órgão que regula a profissão, justamente pelo fato de cada jurisdição possuir suas leis e requerimentos da profissão contábil.

 

É importante introduzir como as “práticas contábeis” são reconhecidas e denominadas pelo mundo. No caso das IFRS denomina-se com o mesmo acrômio das normas para se referir as práticas contábeis em conformidade com as IFRS. Nos EUA as práticas são reconhecidas pelo acrônimo GAAP - Generally Accepted Accounting Principles, que em português seria Princípios Contábeis Geralmente Aceitos, sendo comumente referenciado na literatura dos EUA como simplesmente GAAP e na literatura internacional reconhecido como US GAAP, sendo US o acrônimo de United States.

 

Pela influência da língua inglesa e das práticas internacionais é comum referenciar práticas contábeis adotadas no Brasil como BR GAAP, contudo tal uso não é sustentado pelas normas brasileiras sendo apenas “popularmente” chamado desta forma.

 

Abaixo apresentamos um comparativo da relação entre as denominações no contexto brasileiro, IFRS e estadunidense.

 

 

 

Relação entre os padrões contábeis:

Brasil

EUA

IFRS

Como é conhecido a prática/padrão contábil

BR GAAP

US GAAP ou GAAP

IFRS

Principal emissor/desenvolvedor das normas contábeis

CPC

FASB

IASB

Nome das normas contábeis

CPCs

ASCs

IFRSs e IASs

Regulador da profissão contábil

CFC

AICPA

 -

 

 

 

 

Tentativas de convergência entre o IASB e o FASB.

 

Apesar de muitas vezes colocados em posições equivalentes não é apropriado considerar tais órgãos totalmente comparáveis. O FASB opera em contexto que visa regular as práticas no seu país, sendo afetado diretamente pelas regras e práticas deste país o que o leva a ser um padrão que dita, na maioria dos casos, regras ao invés de princípios. É um padrão feito para ser aplicado no contexto dos EUA e possui influencia do órgão regulador da profissão contábil naquele país.

 

Por sua vez o IASB é uma organização internacional, sem vinculação com as regras da profissão contábil de um determinado país, devendo cada jurisdição considerar tais fatores na adoção das práticas e, por tal características as suas normas são estruturadas em uma lógica de princípios que serão aplicados em diferentes contextos, jurisdições e leis.

 

Guardadas as diferenças entre os órgãos, tanto o FASB quanto o IASB reconhecem a necessidade e a importância de terem padrões convergidos ao redor do planeta para contribuir com a transparência, consistência dos números e incentivar o intercâmbio econômico entre os países.

 

Tanto reconhecem que concordaram em trabalhar juntos para obter maior comparabilidade entre os padrões internacionais e em meados dos anos 2000, após o Memorando de Entendimento conhecido por “The Norwalk Agreement”, onde o IASB e o FASB estabeleceram projetos conjuntos que objetivam obter maior comparabilidade entre os padrões internacionais e o USGAAP.

 

Como o programa de convergência bilateral que objetiva buscar uma maior comparabilidade entre os padrões de contabilidade internacionalmente o FASB programou uma estratégia de três partes:

 

·       Desenvolvendo padrões de alta qualidade

 

·       Participação (do FASB) ativamente no desenvolvimento do International Financial Reporting Standards

 

·       Reforço das relações e comunicações com outras organizações nacionais de normatização.

 

Um elemento importante no movimento de convergência das normas do FASB com as IFRS foi o desenvolvimento da “FASB Accounting Standards Codification” que será abordado no capítulo a seguir. A Codificação compilou os princípios do US (GAAP) aplicáveis às entidades não governamentais o que permitiu uma maior facilidade na correlação com as normas emitidas pelo IASB.

 

Outro fator importante que estimulou a convergência entre os dois padrões foi a permissão da SEC, que desde 2008 possibilita que companhias estrangeiras listadas na bolsa dos EUA publiquem suas demonstrações diretamente em IFRS, sem a necessidade de reconciliar os números com o padrão dos EUA.

 

Apesar da permissão para as empresas estrangeiras, empresas estadunidenses são obrigadas a publicarem seus números seguindo o US GAAP.

 

Vale observar ainda que a SEC também permite que as companhias estrangeiras que possuem títulos negociados nas bolsas dos EUA possam publicar as demonstrações seguindo os padrões de seu país, mas nesse caso a conciliação com o US GAAP é requerida, exigência essa dispensada se a companhia publica em IFRS, conforme visto anteriormente.

 

O resultado deste projeto de convergência pode ser visto no desenvolvimento das normas, tendo como ponto alto a publicação conjunta em 2013 pelos dois órgãos de uma norma de reconhecimento de receitas de contratos com cliente, que eliminou de forma substancial as diferenças entre USGAAP e IFRS nessa temática (mais adiante serão abordadas as diferenças remanescentes).

 

As normas ASC 606 e IFRS 15, que tratam do reconhecimento de receita com clientes, emitidas respectivamente pelo FASB e pelo IASB são amplamente convergidas, contudo algumas diferenças são observáveis provocadas por diferenças nos princípios gerais de cada padrão, base da aplicação da norma em cada estrutura (as estruturas conceituais não são as mesmas) e pelo fato dos FASB publicar atualizações sobre temas de forma isolada. Temas esses que serão abordados nesta obra em capítulo específico.

 

Apesar deste ponto alto, após 2013 diversas normas foram debatidas entre os órgãos, contudo com resultados muitas vezes não conclusivos, como por exemplo os projetos de instrumentos financeiros e leasing que, apesar do FASB ter participado das discussões no IASB, as normas continuaram a apresentar diferenças.

 

Mais do que apresentarem diferenças, as novas normas emitidas pelo IFRS sobre leasing e instrumentos financeiros agravaram ainda mais as diferenças já existentes entre os padrões, podendo indicar o fim da “lua de mel” da aproximação dos dois padrões.

 

 

 

Diferenças conceituais

 

Nos capítulos a seguir iremos abordar, por elemento das Demonstrações Contábeis, as principais diferenças entre o USGAAP e as normas brasileiras e as IFRS, contudo é válido enfatizar que tais padrões são bem similares e as diferenças muitas vezes trazem pouco impacto operacional.

 

Contudo alguns casos como: Instrumentos Financeiros, Propriedades para Investimento, Ativos Biológicos e Leasing, existem diferenças que podem acarretar à resultados e conclusões materialmente diferentes e por isso serão abordados em maior detalhe em seus respectivos capítulos.

 

Além das diferenças factuais entre os elementos das Demonstrações Contábeis, existem diferenças conceituais e estruturais entre os padrões que causam reflexos nas diferentes áreas e tópicos, valendo destaque para a abordagem conceitual.

 

O USGAAP é baseado em regras, enquanto o IFRS tende a se basear, principalmente em princípios. Em IFRS, por ser uma estrutura baseada principalmente em princípios, há o potencial para mais interpretações diferentes entre transações similares, mesmo que sejam esperado conclusões similares por profissionais igualmente capacitados.

 

Cada abordagem possui vantagens e desvantagens. Por exemplo, por ser uma estrutura baseada em princípios as IFRS possuem um volume menor em comparação com o USGAAP e requerem uma atualização menor. Isto se dá pelo fato dos princípios requererem julgamentos profissionais e, mesmo que a realidade mude, os princípios podem continuar a fazer sentido e a serem aplicados.

 

Já o USGAAP, por ser uma estrutura mais baseada em regras, possui um volume maior e tende a ser atualizado de forma mais frequente, gerando maior manutenção, na medida em que os cenários se alteram.

 

O USGGAP por sua vez possui vantagem de reduzir as inconsistências entre empresas por limitar em maior grau as interpretações. Nota-se que as vantagens de um padrão estão relacionadas as desvantagens do outro, e vice-versa.

 

Essa diferença de abordagem conceitual causam efeitos práticos, conforme veremos mais adiante, existindo situações em que o USGAAP exige a aplicação de determinada pratica ou estabelece um expediente prático, porém as IFRS permitem a avaliação e entendimento para definir qual prática a ser adotada.

 

Outro aspecto importante é que as IFRS tendem a exigir mais requisitos para notas explicativas e divulgações justamente para explicar aos usuários as premissas adotadas. Já em USGAAP, comparativamente, tais divulgações tendem a ser menores.